“Mouraria” playlist

O legado do Fado na Mouraria.

Para acompanhar o trabalho de campo do grupo de alunos que integram o “Erasmus+ BIP – Miradas sobre la Ciudad”, compilámos alguns exemplos de cultura musical lisboeta e portuguesa. Pretendemos que seja uma lista de músicas que remeta para os temas da “Miradas sobre la ciudad”, da cidade contemporânea, com as narrativas que a acompanham, e com o bairro da Mouraria.

Por Joana Semedo, aluna do Mestrado em Museologia

Playlist de músicas relacionadas com o bairro da Mouraria.

Mapeando o passado com SIG: Cartografia histórica da Mouraria nos séculos XVIII e XIX

A cidade é um organismo vivo e em constante transformação, que reflete mudanças sociais, econômicas e culturais ao longo do tempo. Pensar a cidade, especialmente bairros históricos como a Mouraria, em Lisboa, requer necessariamente compreensão de sua evolução. A análise da cartografia histórica torna-se uma ferramenta indispensável nesse processo, revelando a natureza das dinâmicas paisagísticas urbanas. Há casos em que determinados traços urbanos persistem mesmo após séculos, demonstrando tendências de resistência arquitetônica, e noutros, há momentos disruptivos que rompem completamente uma lógica urbana anterior. Esses fenômenos são apenas alguns dos marcos mais visíveis, que pontuam a vida intensa de um núcleo urbano.

As cidades, como centros de convivência humana, acumulam camadas de história que se sobrepõem e interagem. Compreender essas camadas é crucial para planejar o futuro de maneira informada e sensível ao patrimônio cultural. Pensar a cidade ao longo do tempo não é apenas um exercício acadêmico, mas uma necessidade prática para a preservação da identidade urbana e para a criação de espaços que respeitem suas origens enquanto atendem às demandas contemporâneas. A Mouraria, um dos bairros mais antigos de Lisboa, objeto de estudo do projeto, é enxergada aqui como um microcosmo das dinâmicas urbanas de longa duração. Fundada há séculos, o bairro tem sido palco de inúmeras transformações, desde suas origens como reduto mouro até seu papel atual como um vibrante centro multicultural. Cada fase de sua história deixou marcas indeléveis em sua estrutura urbana, muitas das quais são documentadas em cartas cartográficas ao longo dos séculos.

A análise de cartas históricas da Mouraria, como as de João Nunes Tinoco (1650), Carlos Mardel (1756), a Planta Topográfica de 1780, de Duque Wellington (1812), e outras do século XIX, oferece uma visão detalhada de sua evolução. Essas cartas não são meramente registros gráficos; são narrativas visuais que contam a história do desenvolvimento urbano, das mudanças infraestruturais e das adaptações sociais e econômicas. Ao estudar essas cartas, é possível identificar elementos urbanos que persistem ao longo dos séculos. Por exemplo, certos traçados viários e estruturas principais permanecem reconhecíveis, mostrando uma continuidade que resiste às mudanças superficiais. Esses traços persistentes são fundamentais para a identidade do bairro, proporcionando um senso de continuidade e pertencimento para seus moradores. Por outro lado, as transformações documentadas nas cartas revelam as adaptações necessárias para responder às novas necessidades. A reconstrução após o terramoto de 1755, as modernizações infraestruturais do século XIX, e outras intervenções refletem a capacidade da cidade de se reinventar, mantendo-se funcional e relevante para seus habitantes.

 

A análise da cartografia histórica da Mouraria não é apenas um olhar para o passado, mas uma ferramenta para planejar o futuro. Entender as raízes e os traços persistentes da cidade permite uma abordagem mais informada e respeitosa no desenvolvimento urbano. Preservar esses elementos enquanto se adapta às necessidades contemporâneas é um desafio que exige sensibilidade e visão estratégica. Pensar a cidade ao longo do tempo, especialmente em contextos históricos como o da Mouraria, é essencial para a preservação de sua identidade e para o planejamento urbano sustentável. A cartografia histórica oferece uma janela para o passado, revelando tanto a continuidade quanto a transformação que moldam o tecido urbano. Ao compreender a integração dessas análises no planejamento urbano, podemos criar cidades que honrem suas histórias enquanto abraçam o futuro, respeitando as formas de ser e estar daqueles que vivem e daqueles que sedimentaram esses espaços.

Por Raphael Corrêa, aluno da Licenciatura em Arqueologia.

Intervenções e projectos na Mouraria

Conversa com Filipa Bolotinha da Renovar a Mouraria.

No âmbito de um levantamento das várias intervenções realizadas no bairro da Mouraria ao longo das últimas duas décadas, no passado dia 6 de maio, a equipa do projecto “Olhares sobre a Cidade”  foi até à Casa Comunitária da Mouraria para falar com Filipa Bolotinha, coordenadora geral da Associação Renovar a Mouraria, com o objectivo de discutir e saber mais sobre as iniciativas projectadas e implementadas no bairro da Mouraria desde o início do século.

A Associação Renovar a Mouraria é uma organização não-governamental para o desenvolvimento, fundada em 2008 com o objectivo de revitalizar o bairro, através de iniciativas comunitárias, educativas e culturais.

Actualmente, conta com uma equipa de cerca de 100 voluntários que se dedicam à integração de diversas comunidades através de ações educativas formativas e culturais, à garantia do acesso à habitação e de outros direitos consagrados para a população da Mouraria, à revitalização económica do território e à defesa e salvaguarda do património histórico, cultural e humano. 

A organização tem-se destacado pelas suas acções de desenvolvimento local e pela integração de pessoas migrantes no bairro e na cidade, assim como pelo seu importante papel ao nível da dinamização cultural.

Na conversa com a directora da Associação, começou-se por abordar alguns projectos enquadrados no contexto do plano de revitalização do bairro que ocorreu no início da década de 2010, como foi o caso do Plano de Desenvolvimento Comunitário (PDCM). À luz deste programa foram realizados diversos projectos e iniciativas que visavam o desenvolvimento do bairro, a nível social, cultural e económico. A própria Associação Renovar a Mouraria elaborou diversos projectos e eventos impulsionados pelo PDCM, como as Visitas com Fado, uma iniciativa que promoveu a divulgação do bairro e que obteve também bastante adesão por parte dos moradores.

Discutiram-se também os primeiros projectos realizados pela Associação Renovar a Mouraria, como o Jornal Rosa Maria, um concurso de fado e o Festival Todos, que se mantém até hoje. Também o Arraial da Associação foi outro projecto desenvolvido nestes anos iniciais da mesma e que se continua a realizar actualmente.

Ao longo da conversa, foram-se abordando outros projectos de desenvolvimento que passaram pela Mouraria, ao longo da década de 2010.

O lançamento do Programa Bip-Zip em 2011 pela Câmara Municipal de Lisboa foi um marco no impulso de projectos de reabilitação de vários bairros de Lisboa e que teve uma grande influência no bairro, através da criação de várias iniciativas que partiram de diversas instituições e associações, incluindo a Renovar a Mouraria.

Este contexto de dinamismo e de uma nova vida do bairro atraiu para o bairro novos frequentadores e até moradores, neste período. No entanto, tanto o período de crise económica como, mais recentemente, a realidade pandémica prejudicaram o financiamento, arranque e continuidade de intervenções no bairro.

Também a diminuição de moradores a título permanente na Mouraria nos últimos anos veio alterar a dinâmica do bairro, trazendo novos desafios e necessidades. 

Saímos da sede da Renovar a Mouraria com um conhecimento muito mais alargado daquilo que foram os projectos implementados no bairro. Devido à sua vasta experiência enquanto coordenadora desta associação, o contributo de Filipa Bolotinha foi essencial para a elaboração deste levantamento, que continua a crescer e a ser actualizado e que será disponibilizado em breve na secção Resultados

Por Joana Semedo, aluna do Mestrado em Museologia.

Mouraria na Maquete de Lisboa antes de 1755

Bairro da Mouraria na Maquete de Lisboa antes de 1755, patente no Museu de Lisboa – Palácio Pimenta.

Ao longo dos séculos, a Mouraria apresentou diferentes configurações, passando por diversos processos de evolução tanto ao nível urbanístico e arquitectónico, como cultural e socialmente. O terramoto de 1755 marcou um dos períodos de maior transformação da cidade devido à destruição causada e também ao planeamento urbano pombalino delineado após o mesmo.

Na emblemática Maquete de Lisboa antes de 1755, idealizada pelo historiador e olisipógrafo, Gustavo de Matos Sequeira, que se encontra no Palácio Pimenta (Museu de Lisboa), podemos encontrar ilustrada a Mouraria anterior ao Terramoto. Esta maquete foi realizada em duas fases, entre 1945 e 1959, por Ticiano Violante e Martins Barata, tendo sido exposta em 1982 no espaço onde ainda hoje se encontra e corresponde, não apenas a um importante documento que nos permite compreender a cidade anterior a 1755, mas também a um testemunho histórico dos estudos olisiponenses que se estavam a desenvolver no período da realização da maquete. 

Apesar de não cumprir uma exatidão completamente rigorosa, nesta concepção daquilo que seria a Lisboa desse período, é interessante observar a Mouraria neste contexto pré-terramoto e procurar compreender o que o caracterizava à altura e também o que persiste no bairro actualmente. Verifica-se então um alargamento das ruas, necessários para permitir melhores condições de acesso e circulação, assim como uma nova organização da malha urbana, que se projectou com maior uniformidade em relação ao anterior ordenamento. 

Olhando para a encosta do Castelo de São Jorge, será relevante ressaltar a ausência de edificações ao seu redor, em contraste com a restante malha que constitui o bairro, atribuindo um maior destaque à estrutura arquitectónica militar que se desenvolve a partir da alcáçova. 

Já no local que hoje corresponde à Praça do Martim Moniz, conseguimos observar a torre que integrava a Muralha Fernandina edificada no século XVI, que actualmente se mantém visível a partir da praça e que se encontra, tal como representada na maquete, ladeada por edifícios. 

Apesar das várias transformações por que passou, a Mouraria apresenta ainda evidentes traços da Lisboa pré-pombalina e pré-terramoto que fazem deste um singular bairro histórico.

Por Joana Semedo, aluna do Mestrado em Museologia

Mouraria nas notícias

No nosso estudo sobre a Mouraria demos uma vista de olhos nas notícias que falavam deste bairro de Lisboa. Durante dois dias em duas semanas distintas de abril de 2024 analisámos 150 notícias que abrangem um período de 2015 a 2024, com vários tópicos e de diferentes canais de notícias.

Atribuimos três temas a cada notícia, de acordo com as palavras-chave que melhor caracterizam cada uma, o que resultou em quarenta temas diferentes. Os temas mais atribuídos foram “habitação” com 67 menções,” incêndio 2023″ com 53 menções, “comunidade” com 46 menções, “urbanismo” com 33 menções e “imigração” com 28 menções. 

As notícias que vimos consistiam em grande parte sobre o incêndio que deflagrou numa habitação na Mouraria em 2023 que provocou dois mortos e catorze feridos. Este foi um tema muito importante uma vez que relançou o debate na esfera pública acerca das condições habitacionais dos imigrantes neste bairro. Muitos destes imigrantes vivem em sobrelotação de espaços, espaços estes com poucas condições e com pouca fiscalização.

Manchete da notícia de um incêndio na Mouraria na edição online do jornal Público de 4 de fevereiro de 2023.

Outro foco de notícias, por ser mais recente, foi a inauguração do funicular que liga o bairro da Mouraria ao bairro da Graça (no passado mês de Abril), uma obra que estava em desenvolvimento desde 2009 e que só foi concluída em março de 2024. Esta é uma obra importante para a acessibilidade deste bairro permitindo a ligação entre a Graça e a Mouraria de uma forma mais fácil e mais rápida.

Manchete da inauguração do funicular da Graça na edição online do jornal Expresso de 12 de março de 2024.

A marginalidade e o crime presente neste bairro também foram alvo de notícias, mais precisamente sobre o consumo e tráfico de droga bem como a presença da grupos criminosos estrangeiros criando um clima de insegurança nos moradores.

Manchete da notícia sobre insegurança na Mouraria na edição online da RTP Notícias de 4 de fevereiro de 2020.

A marcha da extrema-direita realizada no passo mês de fevereiro de 2024 também foi alvo de destaque nas notícias noticiando o aumento destes movimentos xenófobos e racistas para os imigrantes, em especial das comunidades muçulmanas e do sudoeste asiático que se localizam em sua grande parte na Mouraria.

Manchete da notícia sobre uma manifestação na edição online do site ZAP de 19 de janeiro de 2024.

A construção da mesquita também é um tema importante, alvo de cobertura mediática devido às suas implicações como o despejo de moradores das suas habitações para a construção da mesma, e apesar de ser necessária devido à presença de uma comunidade muçulmana considerável neste bairro este projeto vai trazer grandes alterações a nível urbanística no bairro.

Manchete da notícia da nova mesquita da Mouraria de uma manifestação na edição online do jornal Público de 1 de agosto de 2020.
Resultados da pesquisa sobre a Mouraria nas notícias.

Por Diogo Sebastião, aluno do Mestrado em Arqueologia

Diário de Campo, 22/04/2024 (1)

Mapa do percurso realizado no bairro da Mouraria.

Começamos o nosso percurso às 16:40 saindo do Centro de Inovação Mouraria descendo a Travessa dos Lagares e nesta descida reparámos em alguns edifícios que percorriam esta rua especialmente as portas destes prédios devido às suas singularidades.

Descendo a Travessa dos Lagares chegámos ao Largo do Terreirinho onde observámos a habitual trânsito de carros e população neste local, seguimos pela rua Marquês Ponte de Lima e decidimos explorar a Vila Almeida, um pequeno conjunto habitacional maioritariamente composto por imigrantes em pequenos lotes habitacionais e conversamos com um dos moradores que nos explicou a sua situação e como foi viver para este local e ao lado da sua casa existia uma talha de grandes dimensões bem conservada.

Após a nossa visita à vila Almeida passámos pelo Beco da Amendoeira e conversámos também com uma das moradoras deste beco que nos indicou uma associação presente neste beco, a associação Ideias com Panos cuja proprietária Amália explicou-nos o que fazia na associação e como obteve este espaço, nesta associação são realizados  workshops de costura e Amália faz os seus trabalhos de costura estando atualmente a fabricar os fatos das crianças das marchas populares dos bairros da Mouraria e da encosta do castelo, alertou-nos da diminuição das crianças destes bairros ao longo dos anos.

Após a nossa visita ao Beco da Amendoeira percorremos a Calçada de Santo André até chegarmos de novo ao Largo de Terreirinho e voltamos a entrar na rua Marquês Ponte de Lima tendo depois virado no Pátio do Coleginho onde observámos azulejos numa das fachadas do edifício neste pátio, seguimos a rua Marquês Ponte de Lima até chegarmos às escadinhas da saúde onde terminámos o nosso percurso.

Diogo Sebastião, aluno de Mestrado de Arqueologia.

Ensino unido à Investigação: a Unidade Curricular “Olhares sobre a Cidade: estudo interdisciplinar dos centros históricos” na NOVA FCSH

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No âmbito do projecto Erasmus Bip “Miradas sobre la ciudad”, foi proposta uma Unidade Curricular de integração (UC) em projecto, oferecida pelo Centro de Investigação CHAM – Centro de Humanidades na Faculdade de Ciências Sociais e Humadas da NOVA.

Esta UC foca-se no estudo de uma zona histórica da cidade de Lisboa, a Mouraria, particularmente afetada pela atividade turística e hoteleira e pelas novas dinâmicas de reabilitação urbana, com efeitos negativos significativos na qualidade de vida dos residentes e na perda do carácter de bairro que sempre identificou esta zona. Fortemente multicultural, as comunidades patrimoniais têm cada vez mais desafios, que este projecto está a identificar com vista à apresentação de propostas para um modelo de cidade sustentável caracterizado por uma resiliência equitativa e inclusão dos valores históricos e culturais. Através de uma primeira fase de caracterização da área de estudo, apoiada na investigação e na observação participante, junto com os parceiros locais, criar-se-á um dossier de trabalho com propostas de intervenção baseadas nos eixos temáticos da inclusão, a habitação, e o património.

Orientada pelas docentes Leonor Medeiros e Mafalda Pacheco, esta UC foi disponibilizada a alunos de licenciatura e mestrado das áreas de Arqueologia, História, História de Arte, Antropologia, Gestão do Território, Urbanismo Sustentável e Ordenamento do Território ou áreas afins.

As primeiras reuniões de trabalho decorreram na FCSH, definindo os limites da área de intervenção e fazendo uma primeira análise da malha urbana, com uma visão histórica da evolução do espaço e um primeiro levantamento dos recursos patrimoniais existentes.

Diário de Campo, 22/03/2024 (2)

Mapa do percurso realizado no bairro da Mouraria.

Em poucas ruas, muito contraste. Hoje fizemos um percurso curto mas pleno de diferenças, demorando-nos em cada paragem, seja pela conversa seja pela análise de pormenores que pouco a pouco se tornam mais evidentes, à medida que o trabalho de campo avança.

Adentramos por uma vila operária (a Vila Almeida 13), encostada ao Coleginho, “primeira casa própria da Companhia de Jesus em todo o mundo”. Pelos espaços que ligam casas e sobem a vertente, vamos encontrando homens jovens e mais velhos, uma criança pela mão do pai, provavelmente do Bangladesh, que nos cumprimentam e respondem em Português perfeito. Um deles usa o chão como mesa de trabalho, colocando rosas dentro de embalagens de plástico – daquelas que depois vemos a serem insistentemente vendidas junto de mesas onde qualquer casal se junte para jantar. Uma delas, possivelmente partida no processo, é presenteada ao grupo. Junto a ele, um senhor mais velho, com o ar típico de português de bairro, vem estender roupa à porta. Está ali há apenas um mês, mas é lisboeta desde sempre, e andou por todo o lado – não perguntamos detalhes, talvez temendo alguma história mais pesada de sem abrigo, mas esperamos poder continuar a conversa mais tarde. Mesmo junto à sua porta, ainda se vê uma talha, meia enfiada no chão, rachada, com uma lage de pedra a tapar a boca. O senhor insiste que pode ser um forno ou um alambique, e em vão tentamos explicar que seria um silo para armazenar bens alimentares.

Na rua mesmo ao lado, conversamos com uma senhora que nos ouve a comentar uma inscrição em pedra sobre uma ombreira, e se assoma à porta, calorosa e simpática. Ao comentarmos uma loja que vemos no outro lado do pequeno largo da Rua da Amendoeira, insiste que sim, que vamos lá, pois lá está a sua comadre. Esta, Natália, tem este projecto há 6 anos, onde tanto arranja antigo como faz novo. Na “Ideias com Panos”, um projecto com o apoio da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, fala-nos dos vários projectos que tem feito ao longo dos anos, desde vestidos de casamento a cortinas de cinema. E mostra-nos, com a provocação de quem mostra algo que ainda é segredo, o desenho dos fatos das marchas deste ano – imediatamente começamos a reconhecer nos panos que nos rodeiam os padrões e cores dos fatos, cada um feito à medida para quem o vai usar, com o nome escrito a giz no pano. Ambas estas senhoras moram neste largo há mais de 50 anos, e vêem-se felizes. O que contrasta com a nossa primeira entrada naquela estreita rua, marcado pela droga e pela ilegalidade, e que assim estranhamente se abre para esta luz e alegria.

Continuaremos a ver estes contrastes numa próxima rua, por detrás do Coleginho de Santo-Antão-o-Velho, onde, junto a uma porta e fachada reabilitadas, vemos um homem de meia idade, promotor imobiliário talvez, a acabar de mostrar uma casa a um jovem estrangeiro. Em inglês, elogia a casa e comenta outras tantas que tem por Lisboa, mas mais longe do centro.

Demonstra-se assim a diversidade e a riqueza da Mouraria, em 3 ruas contíguas, que se estendem da Rua do Marquês de Ponte de Lima em direcção ao castelo.

Leonor Medeiros, arqueóloga

Diário de Campo, 18/03/2024

Mapa do percurso realizado no bairro da Mouraria.

No dia 18 de março, pelas 15:30, realizámos um passeio pela Mouraria que partiu da Travessa dos Lagares, com o intuito de fazer um registo de impressões a partir dos cinco sentidos. 

Ao longo do percurso procurámos registar cores, cheiros, texturas, elementos visuais como pontos de vista, estruturas arquitectónicas e outras noções que permitissem caracterizar o bairro.

Apesar de o tempo não ter sido muito, foi-nos possível detectar em meia hora características interessantes, desde logo, na subida ao Caracol da Graça, onde a arte urbana marca a sua presença de uma forma subtil, entre as cores vibrantes, próprias da arquitectura deste espaço. Diferentes cores e estilos de azulejo foram-nos acompanhando ao longo do trajecto, ornamentando os edifícios e chegando a estar presente até entre as peças da calçada, numa conjugação inesperada mas bastante expressiva de uma noção identitária, tanto do bairro como de Lisboa.

A relação com outros pontos da cidade foi também interessante de observar, estando a Mouraria situada na capital das sete colinas. Desde o rio que se vislumbra a partir do topo do Caracol da Graça, à Igreja de São Vicente de Fora que surgiu na paisagem enquanto percorríamos a Travessa das Mónicas, são vários os pontos de vista possíveis ao longo percurso.

Chegados ao largo do Menino de Deus, fomos surpreendidos pela igreja barroca do cimo da calçada que, apesar de imponente, passa algo despercebida naquele que é um dos limites que forma o bairro.

Será relevante ressaltar que não encontrámos na nossa curta rota, algum tipo de apoio à mobilidade condicionada, pelo que, ao nível da acessibilidade considerámos que existe ainda uma urgência para a reflexão e acção sobre este tema que não deve ser desconsiderado.

Ao percorrer a calçada de Santo André, deparámo-nos com o Largo do Terreirinho (que pela sua dimensão aparenta estar sempre com alguma afluência) subindo, de seguida, a estreita Travessa dos Lagares para retomar o nosso ponto de partida.

Joana Semedo, aluna de Mestrado em Museologia

Diário de Campo, 11/03/2024

Mapa do percurso realizado no bairro da Mouraria.

O nosso primeiro percurso, espontâneo e com intuito de explorar o território, teve como ponto de partida inicial as Escadinhas da Saúde, em frente à Praça Martim Moniz. Infelizmente, estavam fechadas, então decidimos seguir em direção à Casa-Museu Fernando Maurício que, embora também encerrada, dispunha de arte nas ruas que nos envolvia com elementos que remetiam ao universo do fado e de uma atmosfera gradualmente menos turística.

Ao alcançarmos o ponto mais alto do trajeto, descemos pela Rua da Costa do Castelo até chegarmos a um dos principais enclaves do bairro, a Travessa do Açougue. A partir desse momento, percebemos uma retomada da intensidade turística, principalmente na via escolhida para seguirmos, a Calçada de Santo André. Mudamos depois para a Rua dos Lagares e passamos pelo Funicular da Graça, prestes a ser inaugurado no dia seguinte, e também pelo Centro de Inovação da Mouraria, a “sede” do projeto.

Ao desviarmos para o Largo das Olarias, nos deparamos com a Villa Luz Pereira, uma antiga vila industrial. Continuamos nosso percurso pela Rua das Olarias e pela Rua da Bombarda, até tomarmos a Travessa do Maldonado em direção ao Intendente, onde decidimos concluir nossa caminhada. Retornamos à Praça Martim Moniz via Avenida Almirante Reis e Rua da Palma.

Raphael Corrêa, aluno de Licenciatura em Arqueologia