Olhares Estratigráficos sobre a Mouraria: Exercício Prático de Arqueologia da Arquitectura na Igreja de São Lourenço / Palácio da Rosa

No segundo semestre de 2024/2025, os estudantes da unidade curricular Arqueologia da Arquitectura tiveram como caso de estudo prático as fachadas da Igreja de São Lourenço, situada no Largo da Rosa, na Mouraria.

O exercício, desenvolvido no âmbito da Licenciatura em Arqueologia da NOVA FCSH, procurou proporcionar um contacto direto com os métodos da arqueologia do edificado, combinando o levantamento técnico e fotogramétrico com a análise estratigráfica e a construção de narrativas históricas sobre o espaço construído.

O imóvel seleccionado, marcado por múltiplas intervenções desde a sua reconstrução pós terramoto de 1755 até à atualidade, revela-se um excelente exemplo da complexidade urbana e patrimonial de Lisboa. Entre rebocos, estelas reutilizadas, grafitis e camadas de tinta corretiva, os/as estudantes foram convidados a interpretar o edifício como um documento histórico vivo — onde se inscrevem fases de construção, abandono, resistência e transformação.

O trabalho de campo incluiu:

  • a leitura estratigráfica das alvenarias e rebocos,
  • a identificação de Unidades Estratigráficas Murais (UEM),
  • a elaboração de esquiços e desenhos técnicos,
  • o registo fotográfico e fotogramétrico,
  • a observação sensorial do espaço edificado,
  • e a construção da respetiva matriz de Harris.
Fotogrametria da fachada do Palácio da Rosa, junto à igreja de São Lourenço.
IgrejadeSaoLourenço_2425

A investigação permitiu não só identificar diferentes fases construtivas e simbólicas da fachada, como também refletir sobre os desafios contemporâneos do seu uso e valorização patrimonial num bairro em constante mutação. Embora limitado em tempo e recursos, o exercício culminou numa série de interpretações visuais e escritas que pretendemos agora partilhar com o público, como forma de contribuir para uma reflexão mais alargada sobre o património edificado da Mouraria.
Fica assim aqui um outro olhar possível sobre a Mouraria.

Artigo da autoria de Leonor Medeiros, professora da FCSH-NOVA.

Arqueologia-da-Arquitectura-Igreja-São-Lourenço

Intervenções e projectos na Mouraria

Conversa com Filipa Bolotinha da Renovar a Mouraria.

No âmbito de um levantamento das várias intervenções realizadas no bairro da Mouraria ao longo das últimas duas décadas, no passado dia 6 de maio, a equipa do projecto “Olhares sobre a Cidade”  foi até à Casa Comunitária da Mouraria para falar com Filipa Bolotinha, coordenadora geral da Associação Renovar a Mouraria, com o objectivo de discutir e saber mais sobre as iniciativas projectadas e implementadas no bairro da Mouraria desde o início do século.

A Associação Renovar a Mouraria é uma organização não-governamental para o desenvolvimento, fundada em 2008 com o objectivo de revitalizar o bairro, através de iniciativas comunitárias, educativas e culturais.

Actualmente, conta com uma equipa de cerca de 100 voluntários que se dedicam à integração de diversas comunidades através de ações educativas formativas e culturais, à garantia do acesso à habitação e de outros direitos consagrados para a população da Mouraria, à revitalização económica do território e à defesa e salvaguarda do património histórico, cultural e humano. 

A organização tem-se destacado pelas suas acções de desenvolvimento local e pela integração de pessoas migrantes no bairro e na cidade, assim como pelo seu importante papel ao nível da dinamização cultural.

Na conversa com a directora da Associação, começou-se por abordar alguns projectos enquadrados no contexto do plano de revitalização do bairro que ocorreu no início da década de 2010, como foi o caso do Plano de Desenvolvimento Comunitário (PDCM). À luz deste programa foram realizados diversos projectos e iniciativas que visavam o desenvolvimento do bairro, a nível social, cultural e económico. A própria Associação Renovar a Mouraria elaborou diversos projectos e eventos impulsionados pelo PDCM, como as Visitas com Fado, uma iniciativa que promoveu a divulgação do bairro e que obteve também bastante adesão por parte dos moradores.

Discutiram-se também os primeiros projectos realizados pela Associação Renovar a Mouraria, como o Jornal Rosa Maria, um concurso de fado e o Festival Todos, que se mantém até hoje. Também o Arraial da Associação foi outro projecto desenvolvido nestes anos iniciais da mesma e que se continua a realizar actualmente.

Ao longo da conversa, foram-se abordando outros projectos de desenvolvimento que passaram pela Mouraria, ao longo da década de 2010.

O lançamento do Programa Bip-Zip em 2011 pela Câmara Municipal de Lisboa foi um marco no impulso de projectos de reabilitação de vários bairros de Lisboa e que teve uma grande influência no bairro, através da criação de várias iniciativas que partiram de diversas instituições e associações, incluindo a Renovar a Mouraria.

Este contexto de dinamismo e de uma nova vida do bairro atraiu para o bairro novos frequentadores e até moradores, neste período. No entanto, tanto o período de crise económica como, mais recentemente, a realidade pandémica prejudicaram o financiamento, arranque e continuidade de intervenções no bairro.

Também a diminuição de moradores a título permanente na Mouraria nos últimos anos veio alterar a dinâmica do bairro, trazendo novos desafios e necessidades. 

Saímos da sede da Renovar a Mouraria com um conhecimento muito mais alargado daquilo que foram os projectos implementados no bairro. Devido à sua vasta experiência enquanto coordenadora desta associação, o contributo de Filipa Bolotinha foi essencial para a elaboração deste levantamento, que continua a crescer e a ser actualizado e que será disponibilizado em breve na secção Resultados

Por Joana Semedo, aluna do Mestrado em Museologia.